“Vossa majestade, os cavaleiros mais notáveis de todo o reino já estão em prontidão esperando pelo senhor.”
“Urgh, que saco, não é como se existisse alguém que pudesse me proteger.”
“Sem dúvida, no entanto a tradição de escolher o Protetor das Bordas transmitida pelos nossos ancestrais não pode ser anulada nem mesmo pelos atuais monarcas, Vossa Excelência.”
“Certo. Bom, pelo menos vai ser melhor do que ficar aqui sentado o dia inteiro pensando em formas de proteger as ovelhas de algum aldeão desatento.”
“Mais lobos apareceram no leste Vossa Majestade?”
“Voce não soube? Certo, você esteve ocupado com a cerimonia do Protetor das Bordas. Não posso dizer se foram os lobos que invadiram ou os donos que se descuidaram, mas aparentemente sim, ouveram alguns problemas com os lobos daquela área. Mas o mais estranho de tudo isso não foram os ataques no leste e sim um que ocorreu ao norte da muralha, onde não há acesso as nossas florestas.”
“Mandarei alguém tomar as devidas providencias, assim não precisará se preocupar com isso por hora.”
“Mhm, vamos indo.” disse o Rei.
Do lado de fora, não existiam grandes multidões mas sim apenas os quarenta e seis cavaleiros solicitados, os três grandes anciões do reino e dois mestres marciais, irmãos jurados do rei.
Enquanto os cavaleiros se colocavam em forma em meio ao pátio, na plataforma de frente ao palácio, seis acentos estavam dispostos atrás do trono do rei. Para os grandes anciões, os mestres marciais e por ultimo um que se mantinha vazio mesmo quando o rei já estava de entrada.
“Saúdam Sua Majestade, o Rei.” proclamou o conselheiro que acompanhava o monarca antes de subir em uma elevaçao lateral para tomar a posição de juiz.
“Meu deus, aquele imbecil está tão confiente de sua posição que até mesmo se atreveu a se ausentar na cerimonia.” murmurou o rei enquanto a raiva inflamava seu coração. “Certo, aposto que comprou todos esses homens com todos os tipos de promessas. Vamos ver se você ainda vai ousar ter tal arrogância quando tudo terminar.” curvou os lábios em um sorriso malicioso enquanto dizia baixo o suficiente para que apenas seus ouvidos prestassem atenção.
“Que a cerimônia comece.” falou para o público, o conselheiro do rei, como responsável pela cerimônia.
“Hauul Hauul Hauul” berraram os cavaleiros enquanto empurrava o cabo da lança no chão.
Depois que todos ficaram em silencio o conselheiro retirou um pergaminho de aparencia antigo, o mostrou para o público e voltou a falar.
“Todos aqui já foram previamente selecionados como homens capazes de se comprometerem com o reino tanto politicamente quanto em experiência de combate.”
“Conforme a imposição dos ancestrais do reino descrito neste decreto, o candidato a Protetor das Bordas, será aquele que protegerá a muralha de todo o reino e será o pilar de poder por toda uma era, assim como será a retaguarda do rei e dará a ultima palavra quanto a quem assumirá o trono futuramente.”
“Também é imprescindível que o candidato tenha lealdade a linhagem atual da realeza de ao menos quatro gerações em sua família empunhando uma lâmina.”
“O candidato deve ter entre dezesseis e trinta anos.”
“Assim como ele tem a responsabilidade de dar a ultima palavra quanto quem irá assumir o lugar de detentor do trono entre os dois ou mais candidatos escolhidos pelo rei, o rei será quem dará a palavra final quanto a quem será o Protetor das Bordas, mantendo assim um ciclo eterno de heranças e poder entre as duas entidades.”
“Uma cerimônia para a escolha daquele que será apontado como o favorito de Sua Majestade é necessária, então depois de três meses de preparação com o próprio rei, o favorecido irá batalhar contra todos os outros candidatos, um por um, sem pausa, até a morte.”
“Caso o favorito de Sua Majestade seja morto, a competição cessará, outra cerimônia como essa será realizada e outro favorito será selecionado. Outros três meses de preparo serão necessários para que este ciclo se reinicie.”
“Os candidatos devem estar cientes a partir de agora que há apenas dois caminhos a partir desta etapa, a morte ou a glória eterna.”
O conselheiro então fechou seu pergaminho que até agora estava voltado para o público e continha as mesmas regras faladas. Por fim ele ficou em silêncio e voltou seu olhar para o rei.
O rei se levantou lentamente, encarou todos por um momento antes de se pronunciar.
“As regras não podem ser vazadas para fins de impedimento de jogos políticos que possam levar a trapaça ou a traição. Por mais que nos esforcemos, acredito que todos aqui já tinham conhecimento dessas regras por meios questionáveis, afinal nunca tivemos tão poucas pessoas entre os melhores do reino dispostos a se candidatar a um Protetor das Bordas.”
Quando os cavaleiros abaixo ouviram isso, ficaram em choque com as palavras do rei. Anteriormente eles assim como outros dos principais cavaleiros do reino, se beneficiaram muito com as informações passadas a eles a respeito das regras, assim como puderam desfrutar de algumas mordomias patrocinadas por seu informante, que também buscava algo com o futuro Protetor das Bordas.
Claro que, como eles nunca haviam ouvido falar da forma de seleção, também não faziam ideia que com apenas um olhar, os fatos ficavam claros como o dia.
Não apenas o rei notou isso, mas também os anciões, os mestres marciais e o conselheiro, que não pode deixar de balançar a cabeça com um sorriso irônico quando ouviu as palavras do rei.
Ele era a pessoa mais próxima do rei afinal, como ele não poderia notar as intenções maliciosas do rei para com a cerimonia em andamento depois de tais palavras.
“Sendo assim, hoje eu escolho meu favorito ao trono, aquele que treinará comigo nos próximos três meses e lutará até a morte contra todos os seus oponentes candidatos. Seu nome é...” disse o rei antes de uma breve pausa para encarar a todos no pátio.
Silêncio*
Eles achavam que depois de um discurso tão bombástico e revelador, eles estariam acabados e nunca mais poderiam ver a luz do dia, que seriam condenados por receberem informações que eles nem ao menos procuraram e apenas caiu em suas mãos de graça. Claro que eles também não ousaram recusar tal vantagem, pois nunca esperariam um resultado tão vergonhoso.
Silêncio*
“Seu nome é...Liu Yan. O cozinheiro.”
Muito mais silêncio*
Bocas abertas*
Nesse momento até mesmo o conselheiro que sabia que seja lá o que o monarca fosse fazer, poderia chocar a todos, não pode deixar de olhar para o rei com os olhos arregalados em descrença.
“Com licença Vossa Majestade, mas as regras dos ancestrais não permitem que...”
“Todos ouviram ancião, as regras são claras. ‘é imprescindível que o candidato tenha lealdade a linhagem atual da realeza de ao menos quatro gerações em sua família empunhando uma lâmina’. Pelos meus conhecimentos, Liu Yan vem de uma família de cozinheiros que tem sua lealdade a nossa linhagem por pelo menos oito gerações, o que já ultrapassou em muito os requisitos. Além disso Liu Yan apesar de ser um jovem de apenas dezesseis anos de idade, já empunha sua lámina de cortar carne a mais dez anos, o que o torna um candidato válido segundo os requisitos dos ancestrais.”
Dessa vez quem começou a falar foi o Terceiro Ancião antes de ser interrompido pelo rei.
“Vossa majestade, se me permite falar, as informações vazadas sobre a seleção não foram trazidas a eles por meio de uma procura pessoal, segundo minhas informações pode até mesmo ter sido alguém da própria realeza que passou essas informações a esses homens. Peço que Vossa Majestade faça o que seria o justo por estes senhores.” o Segundo Ancião também ficou carrancudo e não pode deixar de falar.
Ele sabia muito bem que o rei tinha o conhecimento, assim como ele, de quem vazou essas informações e que não tinha sido alguém com quem o rei deveria se opor. Isso não por que a pessoa tivesse mais poder que o rei, mas por que essa pessoa era seu próprio filho. O principe.
“Me mantenho firme na minha decisão.” dito isso ele ainda olhou para um certo homem, como se estivesse esperando sua decisão.
Os outros anciões também olharam para o senhor sentado no meio, entre os dois anciões.
Este homem era o Primeiro Ancião.
“Ele não é adequado para o combate Vossa Majestade, se você pretende matar o cozinheiro, apenas o faça de uma só vez” Apesar das palavras duras para o rei, ninguém, nem mesmo o rei ousou desconsiderar as palavras daquele velho sem barba e com três cicratrizes verticais de garra na cara.
Apenas os cavaleiros abaixo, que não o conheciam, inspiraram ar frio e suaram profusamente de tão nervosos, depois das palavras duras do ancião em direção ao rei.
“Não tenho tais intenções Primeiro Ancião.” o rei se voltou ao primeiro ancião respeitosamente juntando a palma da mão com o punho em sinal de respeito antes de continuar. “Vou provar que sou capaz de transformar um absolutamente ninguém, sem talento ou destino, em alguém realmente digno.”
“Certo. Se é assim, não tenho objeções.” Disse o primeiro ancião antes de fechar os olhos como se nada mais tivesse haver com ele.
Aqueles cavaleiros estavam pasmos com aquela cena. Só haveria uma pessoa digna de tal tratamento em todo o reino além do rei.
O atual Protetor das Bordas.
Um ser supremo, simbolo do poder de uma era e capaz de viver por pelo menos três reinados consecutivos sem a necessidade de se congelar nas grutas subterrâneas graças aos segredos da herança que apenas os Protetores aceitos tem acesso, e ainda assim apenas depois de cinquenta anos de serviços prestados sem um único erro.
Ninguém sabia, mas todo Protetor das Bordas tomava o título de Primeiro Ancião, afim de observar o novo Protetor das Bordas, aconselha-lo e, por fim, depois de cinquenta anos, transmitir seu legado que leva sua longevidade aos limites.
“Obrigado Ancião” respondeu o rei juntando punho e palma outra vez, em respeito a senioridade, por mais que não houvesse necessidade de tal etiqueta.
O rei então não mais ficou lá, deu uma última olhada em todos, respirou fundo como se lamentasse por suas vidas perdidas, se virou e seguiu para o palácio, onde voltaria para seus deveres de monarca.
“Certo. Todos ficarão hospedados nas acomodações ao lado do palácio real e serão observados durante estes próximos três meses como de costume, para o caso de uma possível derrota do favorito e também para manter em segurança os segredos discutidos hoje.” disse o conselheiro no final.
Os Mestres Marciais apenas observaram o tempo todo. Afinal eles estavam apenas como convidados por serem irmãos jurados e grande apoio de força e gestão militar para o rei.
Por mais que alguns segredos tenham sido discutidos hoje, estes irmãos já haviam feito juramento de sangue jurando lealdade ao rei.
Um juramento de sangue não poderia ser quebrado, pois se não todo o sangue da pessoa seria retirado de dentro do seu corpo e serviria de alimento para os céus como punição.
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